Criatividade em 3D (final)
Opiniao

Criatividade em 3D (final)

10/03/2012

Aquisição estratégica
Bernard Charlès conta que no final dos anos 1990 sua empresa estava determinada a transformar o software de projeto Catia numa das mais sofisticadas ferramentas tanto para a indústria aeronáutica quanto para a automotiva. Em lugar de consumir alguns anos no desenvolvimento de novos recursos de aprimoramento do Catia, a Dassault preferiu adquirir uma empresa nascente que dominasse a tecnologia 3D.

Gerenciamento de ciclo de vida para automóveis
Foi dessa decisão que nasceu a aquisição da SolidWorks, em julho de 1997, quando ela era uma empresa de apenas 50 pessoas, faturava apenas US$ 9 milhões e estava no vermelho: “Avaliei seus produtos e ofereci US$ 350 milhões. Mesmo assim, levei nove meses para convencer fundador da empresa, Jon Hirschtick, a aceitar a proposta e desistir de fazer a oferta pública de ações (IPO), como ele, inicialmente, pretendia. Meus acionistas acharam que eu estava louco, mas eu os convenci da importância estratégica e do futuro da tecnologia 3D. Apesar das previsões mais pessimistas que ouvi de muita gente, o resultado daquela compra foi o melhor possível para a Dassault, numa época em que pouca gente acreditava no importância e no sucesso da tecnologia 3D. Foi, sim, um enorme risco, mas em algumas situações temos de correr riscos. O valor de mercado da marca Catia subiu para US$ 1 bilhão. A indústria mundial ganhou com isso.”
Bernard Charlès relembra que a Dassault Systèmes foi fundada em 1981, na França, por de 15 engenheiros oriundos da Dassault Aviation, que haviam inventado um software de projeto chamado Catia para representar a forma de um avião. A nova empresa concentrou-se em projetos computa-dorizados da indústria aeronáutica, daqueles chamados de superfícies complexas, que podem ser de automóveis ou outras máquinas.
Um das especialidades do Grupo Dassault tem sido a área de software de projetos, em especial em decorrência da criação de ferramentas com numerosos recursos para projetos em 3D, como no caso em que são criados protótipos de aviões em modelos de pequena escala e em simuladores de túnel de vento. Um dos primeiros clientes para esses produtos fora da França foi a Grumman (hoje Northrop Grumman). E, logo depois, a indústria de automóveis alemã BMW. Ao longo de dez anos, até o começo dos anos 1990, a Dassault ampliou seu portfólio de produtos para diversos segmentos além da fabricação de aviões e de automóveis.
PLM, 3D e nuvem
A grande questão para a Dassault no final dos anos 1990 era saber o que viria depois dos softwares 3D e do mockup digital. Para responder a essa questão, Bernard Charlès deu uma volta ao mundo em junho de 1999 e viu que o grande desafio depois de desenvolver um produtor é transferi-lo para o mercado, fazê-lo circular, enviando-o do idealizador ao distribuidor e aos clientes.

Uso do produto é que vai orientar todo o projeto
Daí nasceu o conceito de PLM (Product Lifecycle Management), que permite ao fornecedor e aos usuários gerenciarem o ciclo de vida dos produtos, envolvendo todos os serviços relacionados com os processos industriais e dando uma visão tridimensional de seu ciclo de vida, da concepção à manutenção e à reciclagem.
E agora, em 2012, o presidente da Dassault diz que está comunicando ao mundo que ele crê ser o maior avanço depois do PLM. Qual é esse avanço? Bernard Charlès explica: “É o que chamo de Experiência 3D. O que é isso? Quem vê um gravador digital ou telefone celular como esses que você pôs sobre a mesa percebe logo se esses dispositivos são fáceis de usar ou não. Minha conclusão é que a coisa mais importante, essencial para quem projeta um produto, é verificar antes como ele será utilizado, qual será a reação do cliente ou usuário. É preciso buscar o máximo de conhecimento, de informações e de sugestões em todas as fontes”.
O novo caminho da Experiência 3D contempla, é claro, todo o potencial da computação em nuvem, pois, na visão da Dassault, “a nuvem representa exatamente o que as pessoas querem, isto é, conectar-se ao imenso repositório de inteligência da internet”.
Para prever praticamente tudo que o usuário quer e como ele deverá reagir diante de um novo produto, é preciso usar até a realidade virtual, inclusive conectar o máximo de pessoas, para prevermos o resultado dessa Experiência 3D.
Hoje, na Ford, Alan Mulally usa intensamente softwares de projeto para criar não apenas os novos modelos da empresa, mas também os mais sofisticados carros-conceito e carros do futuro, como mostrou em sua palestra, como keynote speaker no Consumer Electronics Show 2012, em janeiro, em Las Vegas.
A cooperação entre a Dassault e a Boeing foi uma experiência decisiva para mostrar a necessidade de mockups digitais, não apenas na indústria aeroespacial, mas também no setor automotivo e outros.

Ethevaldo Siqueira, colunista do Estadão (aos domingos), é jornalista especializado em telecomunicações e professor universitário, e-mail esiqueira@telequest.com.br