Minhas lembranças
Opiniao

Minhas lembranças

Estávamos no ano de 1952. Eu tinha seis anos, a idade da curiosidade. Morávamos no distrito de Botafogo, em um casebre de madeira, um tanto aconchegante. O trânsito das charretes e carroças nas ruas de terra era mais intenso aos sábados. Estávamos no início do outono, quando os dias são curtos, porém mais bonitos. As frondosas paineiras, com suas flores lilases, davam um tom de alegria ao pitoresco lugarejo. Pela manhã, o efeito policrômico do sol e o vento brando e fresco traziam o aroma perfumado do cafezal da Fazenda Bailão, renovando a nossa esperança.
Certo dia, meu pai ficou acamado e, a pedido de minha mãe, o tio José Tito Rosa foi à única farmácia existente, em busca de socorro. O farmacêutico, após ouvi-lo atentamente, perguntou quem se responsabilizaria pelos gastos. E o tio respondeu prontamente: “Eu me responsabilizo; coloque na minha conta.” Homem simples, de baixa estatura física, de face vincada e ombros estreitos e caídos, tio José era um gigante moral. Venceu os revezes e as adversidades da vida com a altivez de um campeão. A ele, minha eterna gratidão por ter sido um benfeitor para nossa família.
O tempo passou e as dificuldades, sem pressa alguma de partir, permaneceram. Morávamos agora em uma casa melhor. Em certa ocasião,  meu tio Eleonor Tito Rosa, que era bem situado no mundo dos negócios, me confidenciou: “ Vou te dar a escritura da casa onde vocês moram para que seus pais vivam nela até o fim da vida. Posteriormente, venda a propriedade e divida o dinheiro com seus irmãos.” Alto, de olhos azuis, tal qual céu de brigadeiro; a suavidade do olhar permeava toda sua fisionomia. A ele, em memória, minha eterna gratidão, por ter sido, como tio José, um pai para nós.
Muitas vezes, sentimo-nos como que desprezados aqui na Terra, deserdados da sorte e desprovidos de esperanças; esquecemo-nos de que, além de filhos, somos seres especiais para Deus. Se quisermos ter um lugar de maior relevo no coração da vida, nunca devemos pensar no comércio dos próprios dons espirituais. A exigência desnorteia os valores da alma e a troca interesseira entorpece a dádiva. Quem ainda não acredita que a caridade é um instrumento de salvação, quem não percebe ainda que o perdão nos impulsiona para a paz, quem não se interessa pelo bem dos outros e se fecha no egoísmo, quem só vê os erros do próximo e não acredita na missão de Jesus em nosso favor, não tem outro caminho a não ser o do “homem joio”; por conseguinte, não tem evolução espiritual suficiente para andar no bem.
Cultivar a esperança é adquirir a certeza de que a tempestade passa. Ter esperança é confiar em Deus quando tudo parece perdido e nada mais resta a fazer.
“Ante as provas difíceis, jamais te desesperes; não há mal que te alcance se confias em Deus”.                                               Emanuel