O mundo em três telas
Opiniao

O mundo em três telas

07/04/2012

Televisão, computador e smartphone são as três telas que abrangem praticamente todas as comunicações do mundo digital, setor que passa, aliás, pela mais radical e profunda mudança de paradigmas de toda a história da eletrônica. Na verdade, a palavra que poderia definir com maior precisão essa mudança talvez fosse disrupção (do inglês, disrup-tion), já registrada pelo Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.
Sintetizar em três telas toda a comunicação do mundo digital é, sem dúvida, uma fórmula didática perfeita que tem sido utilizada por especialistas para facilitar a compreensão do processo de convergência, entre os quais Rafael Steinhauser, presidente da Qualcomm para a América Latina.
De que modo convergem as três telas? Da forma mais completa e abrangente possível. E mais: as três telas são totalmente reversíveis, pois tudo que uma faz as outras duas também fazem. Assim, a cada dia que passa, a TV mais se transforma e se aproxima de um computador com tela grande. Da mesma forma, pode até exercer as funções de um smartphone. O computador, por sua vez, comporta-se como uma TV ou como um smartphone. E o smartphone assume os papeis de um computador ou de uma TV com tela pequena.

O que muda
“Nas últimas décadas”, relembra Rafael Steinhauser, “as pessoas se comportavam diante da televisão de forma totalmente passiva, recebendo conteúdos prontos e acabados, tanto da TV aberta quanto da TV por assinatura. Esse público acostumou-se a receber programas preparados e empacotados pelas emissoras, sem se preocupar com aplicativos ou sistemas operacionais. O mesmo ocorria até há pouco com os usuários de computadores e do celular. O cliente recebia o aparelho com os aplicativos essenciais, prontos e acabados, num pacote fechado, e passava a usá-lo sem mais problemas.”
Mas esse mundo da comunicação está mudando. A convergência das três telas transforma radicalmente esse cenário, pois a grande tendência dos novos smartphones, laptops e tablets é oferecer um sistema operacional aberto. Daí o grande sucesso do Android.
O mesmo tem ocorrido com outros sistemas operacionais, como o iPhone e o iOS – e, agora, com o Windows Phone, pois todos os smartphones permitem a qualquer desenvolvedor colocar seu aplicativo na plataforma e vendê-lo ou distribuí-lo gratuitamente, via celular ou via internet. E o usuário escolhe o que acha melhor, pagando ou baixando gratuitamente. E não há mais lugar para sistemas operacionais fechados, como no caso do Symbian, que está sendo abandonado pela Nokia em favor do Windows Phone. “Por isso, o Symbian está morrendo”, afirma Steinhauser.

Sistemas abertos
A correlação entre as três telas é hoje tão profunda que, para os especialistas, um celular só adquire o status de smartphone se tiver sistema operacional aberto. Eis aí a grande mudança de paradigma, que permite a colocação de qualquer aplicativo ou software à disposição do usuário. E vale lembrar que os smartphones já dispõem de milhões de aplicativos, um número que nenhum usuário, isoladamente, poderá utilizar em toda a sua vida.
Com esses aplicativos, o cidadão pode baixar também conteúdos da mais variada natureza, inclusive de publicidade. Os sistemas operacionais abertos mudam, assim, toda a cadeia de valores. Isso é disruptivo, como quebra de paradigmas.
Uma diferença fundamental nesse novo cenário é que o cliente deixa de ser verticalizado como no passado, isto é, vinculado exclusivamente a um pacote de serviços ou conteúdos oferecidos por sua operadora. Hoje, o cliente se comporta de forma horizontal, aberta ao acesso a conteúdos ou serviços globais ou universais.
O mesmo aconteceu mais recentemente com outros dispositivos, como os tablets. A grande tendência, portanto, é que todos esses dispositivos – bem como os desktops, laptops, ultrabooks e até mesmo os televisores – tenham num futuro próximo sistemas operacionais abertos.
“Um bom exemplo”, relembra Steinhauser, “é o receptor de TV aberta, lançado no Consumer Electronics Show (CES 2012), em janeiro, em Las Vegas, pela Lenovo e pela Qualcomm, que usa o sistema operacional Android. E funciona perfeitamente bem para tudo que quisermos.”

Três competências
A convergência entre as três telas é resultado de três fatores tecnológicos: capacidade computacional, conectividade e multimídia. Essas três capacidades ou competências tecnológicas precisam ser comuns às três telas. Sem elas não haveria convergência entre smartphones, televisores e computadores.
Vejamos o que ocorre com os novos smartphones, que são acionados a cada dia por chipsets com maior capacidade computacional. Alguns deles são processadores de quatro núcleos, como alguns exibidos Mobile World Congress 2012, em Barcelona, em fevereiro.
“Aqueles pequenos smartphones”, lembra Rafael Steinhauser, “incorporam uma tecnologia ainda mais sofisticada que a dos nossos melhores home theaters, pois os seus chipsets dispõem de recursos extraordinários, como alta definição, microfones sensíveis, alto-falantes, dolby avançado, som surround 7.1.”
A grande diferença é que os smart-phones consomem muito menos energia, não aquecem e custam apenas uma pequena fração do preço dos home theaters.

Ethevaldo Siqueira, colunista do Estadão (aos domingos), é jornalista especializado em telecomunicações e professor universitário, e-mail esiqueira@telequest.com.br